quarta-feira, 28 de março de 2018

PRA TE ENSINAR!

Esse texto nasceu do que seria um relato curto no Facebook, mas foi tomando uma proporção tão grande que eu decidi entrar em contato novamente com esse momento/sentimento pra tentar me libertar ao menos de mais um fantasma que sussurra ao meu ouvidos memórias que eu não gostaria de saber ou lembrar, mas lembro. 


Pois bem, já que estamos aqui, aqui estamos e tome-lhe verbo! Tudo começou quando eu soube que no dia 26/03 era a data de lançamento do primeiro álbum do Gorillaz, que teve sua estreia há 17 anos atrás e me veio umas memórias fortes pois esse álbum é tão importante pra mim, que não foi possível não repensar em tudo que eu estava vivendo quando ganhei esse CD de minha ex professora Nallyne num amigo secreto na escola em meados de 2002. O desenrolar dessa história se deu na época do Ensino Médio, eu devia ter uns 16 anos mais ou menos e eu vou te contar como foi pra mim um dos piores momentos de minha vida sendo um adolescente se descobrindo homossexual e vivendo numa cidade de 10 mil habitantes no meio da caatinga do interior da Bahia.

Era 2002, mesmo sem referência nenhum do que era "ser gay" eu começa a despertar esses sentimentos em mim. Não conhecia outros gays na cidade e apesar de nunca ter beijado um menino na época eu já sentia uma curiosidade pelo gênero masculino, então imagine que meu estado emocional constante naquele momento era dúvida e todas as maiores e piores paranoias possíveis por causa da minha sexualidade; era uma batalha constante e ninguém sabia! Exceto talvez pelas pessoas mais maliciosas que já detectavam sinais de feminilidade que automaticamente eram associados a homossexualidade em mim. As pessoas (inclusive os que diziam ser amigos) usavam isso contra mim na rua e na escola não era diferente… aquelas “brincadeiras” especulativas sobre seu ser gay já aconteciam há um tempo, porém nesse período o bullying psicológico emocional era mais taxativo. Pensando a respeito hoje minha sensação é de que as pessoas queriam a qualquer custo confirmar se Jarbas era viado mesmo, sabe!? O ser humano Jarbas não era considerado como existente e/ou possuidor de sentimentos, o que importava era confirmar se era bicha ou não, independente de qualquer coisa.

Na escola foi organizado um amigo secreto só com a turma da sala que eu estudava, a ideia começou ótima (não estou sendo irônico, eu acho mesmo a ideia boa). A brincadeira teria o adicional de uma "caixa de surpresas" que ficaria na sala dos professores onde durante a semana as pessoas de livre e espontânea vontade poderiam deixar bilhetes para o colega que tinha sorteado, no dia aula da professora que organizou a brincadeira seriam distribuídos os bilhetes ali depositados; como dizer que essa não é uma ideia ótima!? É certo que nem todos mandava bilhetes, mas os que abraçaram a brincadeira fizeram manifestações bem legais de carinho, pistas e quem poderia ser, tinha gente que deixava balas, pirulitos e outros doces pra pessoa eu sorteou… a dinâmica da brincadeira era interessante demais! A caixa duraria até e a semana da revelação do amigo secreto e num desses dias tinha uma carta pra mim. Eu que não tinha recebido nada até então, fiquei todo empolgado, fiz aquela aquela festa na sala pra mostrar que meu "amigo" secreto também se importava se lembrou de mim.

Com o envelope nas mãos e a curiosidade quase me matando por dentro, abri o volume que parecia ser o de um livro pequeno, mas para minha surpresa maior, quando o conteúdo do envelope foi revelado percebi que dentro tinha uma revista pornô, sim, era uma revista de sexo explícito heterossexual, tipo aquelas antigas revista de fotonovela, só que nesse caso a fotonovela era mostrando cenas de sexo explicito entre um homem e uma mulher, com direito a foco na penetração etc… logo na primeira página da revista tinha um bilhete, escrito num papel de guardanapo daqueles de bar que parece seda pra cigarro, com letra propositalmente borrada lia-se a frase: “PRA TE ENSINAR”. Eu congelei na hora!! Parecia que alguém tinha descoberto meu pior segredo da vida! Acho que foi a primeira vez que eu me senti extremamente exposto e ridicularizado. Eu passei a ter aversão extrema a situações de vulnerabilidade depois desse momento, eu fui invadido por uma sensação tão ruim de solidão naquele dia que eu não saberia explicar o quão só eu me senti. Foi ali que eu tive a clareza mental espontaneamente forçada de que a coisa não iria ser nada fácil se eu quisesse ser quem eu verdadeiramente era. Acho que percebi também que não seria naquela cidade muito menos ao redor daquelas pessoas que eu poderia me expressar livremente. Não me lembro exatamente o que houve depois, não sei se foi eu que levei o caso pra diretoria ou foram minhas amigas, ou talvez a professora que organizou o amigo secreto, sei que fui parar na direção; a diretora não sabia o que fazer, os professores Nallyne e Theo (meu primeiro, talvez único, professor gay) meio que tomaram as dores por mim, tentamos descobrir quem tinha enviado a revista revista pornô, mas nada; a diretora foi na sala “falar sobre a situação” e deu textão na turma toda, o que me fez sentir ainda mais exposto e mais ridicularizado, no fim das contas ninguém foi punido. 

Como "prêmio de consolação" fizeram outro sorteio, cancelaram a caixa das cartinhas surpresa, a prof. Nallyne sorteou meu nome (até hoje acho que não foi por acaso e agradeço por isso; e se foi, melhor ainda porque certifica  mais que minha espiritualidade cuida de mim antes mesmo de eu saber que Ela em mim habitava (EPAHEY!). Se eu não estiver errado, penso que o dia da revelação do sorteio foi antecipado e foi nesse dia que Nallyne me deu o CD do Gorillaz e uma agenda/diário (tenho ambos até hoje); a prof. Nallyne, que felizmente se tornou minha amiga e um dos seres humanos que eu mais respeito e admiro no mundo, me salvou ali, talvez até sem saber que estava fazendo. Eu ouvia o CD do Gorillaz repetidas vezes, enumeras vezes pra falar a verdade… fui atrás da tradução das músicas (tomei gosto pelo idiota Inglês, fiz curso e hoje sou fluente na língua). Eu ouvia o CD todos os dias por que eram os pouquíssimos momentos que eu não estava num estado de tensão, auto rejeição e alerta constante, era ouvindo o Gorillaz que eu encontrava o minimo de consolo; até por que de um lado tinha a religião [eu era membro da Igreja Adventista do Sétimo Dia na época] que me dizia que ser gay era uma abominação, um pecado punível de morte eterna, minha família não me apoiava em praticamente nada e obviamente que ser homossexual não receberia apoio (até hoje ainda não tenho esse apoio de vários deles), meus amigos (salve pouquíssimos) também não foram os melhores amigos na época… então, me restavam poucas opções além do pensamento constante de ou me matar ou fugir de onde eu estava, mas era lá na música do Gorillaz que eu ouvia alguém dizer que a vida, minha vida não precisava ser apenas aquilo.

A confusão mental/emocional foi tão enorme que mesmo cerca de 17 anos depois, eu ainda acho difícil descrever o momento e admitir que eu pensei em tirar minha própria vida algumas (muitas) vezes. Eu queria sumir, desaparecer da cidade, mas não fiz por que também tinha no aparelho de som uma música que não era religiosa muito menos motivacional, mas que dizia profundamente para mim que existia um mundo além daquele e essa fagulha de esperança me manteve firme, por isso eu sumi de lá sem olhar pra trás na primeira oportunidade que tive e não me arrependendo nem um pouco. Na verdade, acho que ter saído da cidade foi um dos fatores determinantes para eu ter conseguido ser quem eu sou hoje; talvez, eu não seja grandes coisas, mas sou melhor do que aquele Jarbas com 16 anos de idade, que não ria em foto, só usava preto, bebia bebidas alcoólicas praticamente todos os dias e que detestava estar ao redor de gente, que se trancava dentro do quarto lendo todos os livros que minha prima Ana Maria me emprestava.

Eu sei quem foram as pessoas que me mandaram aquela revista — eu nunca vou esquecer. Eles estão ótimos de vida, aparentemente. Três dos que encabeçaram a "surpresa" estão casados, os três formaram família com direito a filhos, almoço e missa de domingo e foto bonita no Facebook. São eles a perpetuação da dita família tradicional brasileira, os covardes e maliciosos "homens de bem", os "de família". Para algumas pessoas da cidade sei que eu ainda sou apenas e nada somente além do que o viado, porém a bicha aqui hoje é orgulhosa de ser bicha, o viado não precisou "aprender" nada numa revista pornô com cenas de sexo entre homens e mulheres. O gay aqui se recusou a encaixar-se e não foi adestrado dentro do modelo de vida que eles acreditavam ser o melhor. Não conseguiram em "ensinar" nada com a revista pornô, por que eu era gay no dia 04 de agosto de 1986, tanto quando eu era gay lá em 2002 e mais ainda homossexual em 2018 e com certeza muitíssimo mais viado em 2080. Eles mexeram com o meu emocional, mas eles não venceram.

Ao escrever, reler e finalizar esse texto/desabafo não parei de pensar em quantos outros Jarbas não devem existir nesse mundo a fora; não parei de pensar em quantos outros foram tão machucados, maltratados, incompreendidos e tiveram suas vidas arruinadas como eu fui.… meu caso felizmente foi de privilegio e terminou bem (até certo ponto), mas pense quantos outros não aguentam tamanha violência e se matam. Compartilho essa história hoje com o maior desejo, não de ser um exemplo, mas de que ninguém passe por uma situação dessas.

Pra te ensinar, hoje, só o amor e a tolerância. É isso.




Principais músicas:
• Tomorrow Comes Today
• Clint Eastwood (feat. Del tha Funkee Homosapien)
• Sound Check (Gravity)
• Latin Simone (¿Qué Pasa Contigo?) - (feat. Ibrahim Ferrer)
• Starshine
• Slow Country
• Dracula
• Left Hand Suzuki Method
• 19-2000 (Soulchild Remix)

quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Tem horas que eu odeio ser humano



Eu deliro muito nas pessoas, nas atitudes das pessoas; parte talvez, por eu detestar ser uma pessoa (em alguns momentos), ou talvez por curiosidade mesmo de saber por que determinados comportamentos se manifestam em cada um, de uma maneira muito particular que torna tudo e qualquer discurso muito complicado de ser compreensível e aceito por todos e por isso, que na verdade, não tem nada haver com o que eu estou prestes a falar, mas ainda sobre comportamentos e etc... eu tenho essa mania, ou melhor, o comportamento de por vezes me pegar concentrado a linha do tempo, do Facebook e eu observo as coisas que meus amigos postam, mas geralmente, o que me deixa muito intrigado e me faz perder valiosas horas preso numa rede social, quando na verdade eu poderia estar lendo um livro ou botando em pratica meus planos e tals, mas não, eu fico observando os amigos de meus amigos; as pessoas que fazem parte do universo deles, onde não hábito.

Na verdade, eu quero dizer que eu tenho o comportamento de bisbilhotar a vida das pessoas que curtem e/ou comentam as coisas de meus amigos, mas que eu não sou um amigo em comum ou então pessoas que comentam algo absurdo numa página pública. Tá ligado? Eu adoro entrar nesse looping de observação de pessoas totalmente aleatórias e ficar vendo os comportamentos que elas resolvem compartilhar para toda essa rede de conexões de pessoas que, talvez nunca vão estar presente fisicamente na vida de umas das outras, mas não deixam de estarem vinculadas umas às outras por essa grande rede de conexão virtual. E é um looping quase infinito por que dessas pessoas eu vou entrando em perfis de outras pessoas e consigo ir muito longe nessa brincadeira... chego a conclusão que somos fascinantes, tanto quando somos odiosos. 

 Tem horas que eu odeio ser humano.

quarta-feira, 30 de agosto de 2017

A tal "atitude Paulo Gustavo"

Antes de qualquer coisa deixa eu dizer que esse texto não é um ataque pessoal ao humorista Paulo Gustavo, mas é uma critica, sim, a "atitude de Paulo Gustavo", só calhou de ser PG, mas poderia ser qualquer outra pessoa; então fãs, não queiram me matar (se algum fã estiver lendo). É sobre algo muito maior que Paulo Gustavo que escrevo. #PAS!


Então, vamos falar sobre a tal "atitude Paulo Gustavo", que infelizmente não é exclusiva dele, tá?
Recentemente li a noticia que o humorista Paulo Gustavo e seu marido Thales Bretas receberam ataques homofóbicos numa de suas fotos nas Ilhas Maldivas (très chic!); indignado Gustavo foi para o Stories do app Instagram e fez uma sequência de videos, no qual ele declara sua aversão aos ataques homofóbicos e finaliza a fala com:


"Para vocês que são preconceituosos e estão aí me seguindo: eu ainda vou fazer muita viagem esse ano, vou postar muitas fotos com o Thales, porque eu vou ser viado até o último dia da minha vida e vocês vão ter que respeitar"


Então, até aqui tudo bem. Certo?! Não tem nada certo.

Esse é o mesmo Paulo Gustavo, que meses atrás estava dando entrevista dizendo que achava "chato levantar algum tipo de bandeira LGBTQ+", como se ele fosse uma outra classificação de gay; aquela que não se mistura; intocável; a dona; inventora da militância silenciosa; "existir é minha resistência". Vá pra plantar batata no asfalto, né?! Mas é compreensível que essa linha de pensamento vindo de pessoas-paulo-gustavo ou melhor, pessoas que estão dentro do mesmo sistema de privilégios que Paulo Gustavo está inserido. Por ser ator, pessoa publica, branco, rico etc. é impossível negar que o nível de aceitação da homossexualidade de Paulo é maior, a homofobia que ele passa (se é que passa por tanta homofobia assim) é completamente diferente se caso ele não tivesse dentro do sistema singular o qual pertence (e não tem nada de errado em pertencer). Porém, não é aceitável que essas pessoas-paulo-gustavo não entendam que nem tod@s @s pessoas LGBTQ+ não estão vivendo o mesmo grupo beneficiado. Não é concebível que essas pessoas não percebam e reconheçam o quão grande é o alcance da voz delas e/ou quanto elas podem contribuir positivamente para toda uma comunidade, que está sendo massacrada diariamente. Em quanto Paulo Gustavo se enraivece por receber comentário homofóbico em rede social, mas não solta um peito pra ajudar na causa dos Direitos Civis LGBTQ+, ou realmente contra a homofobia tem uma pessoa morrendo a cada 25 horas por ser LGBTQ+.

Quantos heterossexuais conhecemos que foram assassinados por serem heterossexuais? NENHUM! 

Por isso é muito indignante perceber que alguém externo teve que explodir a bolha de privilegio de Paulo Gustavo, para que ele percebesse que existe sim uma violência contra o homossexual no Brasil; ou talvez, nem tenha percebido nada. Repito que não podemos esquecer que a cada 25 horas morre uma pessoa por homofobia neste país, não podemos fechar os olhos para a barbárie que acontece com as transsexuais e travestis ao redor dos estados brasileiros; lembremos de Dandara que foi assassinada brutalmente a pedradas e pauladas no Ceará. E teve gente que filmou!! Gente que ao ver um outro ser humano sendo espancado até a morte e a decisão daquela pessoa foi filmar um assassinato brutal ao invés de ajudar. Vocês conseguem imaginar que existem pessoas que consideram legitimo o ato de matar alguém por causa de sua orientação sexual e/ou identidade de gênero!? Eu não.

Então, vá para puta que pariu a "atitude Paulo Gustavo"!! Por que em quanto ninguém tinha mexido no conto de fadas das férias nas Ilhas Maldivas, era chato levantar bandeira. No entanto quando alguém perturbou a paz das águas cristalinas do Oceano Indico a indignação veio forte e a militância vai ser aguentarmos mais viagens e fotos de um casal homossexual padrão, cis, branco, rico e privilegiado ao redor do mundo; e pensar que poderiam fazer mais, muito mais.

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Atualmente minha cabeça é um lugar horrível para estar


Ninguém quer estar ao lado de alguém que está em confusão emocional; o choro é feio, lágrimas tem gosto de sal e incomodam, a dita falta de amor próprio afugenta quem está ao redor.

Num mundo onde somos obrigados a parecer ser constantemente (para si e para os outros) as melhores versões de nós mesmos, é difícil suportar a pressão, é exaustivo tentar ser perfeito, eficiente, dar atenção a todos, sorrir toda hora, saber resolver todos os problemas; é difícil não se cobrar e desesperar-se quando a cobrança ultrapassa o que você acredita que suportaria. É difícil desenvolver equilíbrio e maturidade emocional. É difícil estar vivo e consciente num mundo onde muita coisa está errada. É difícil não ter dúvidas e insegurança.

Viver é acumulo de emoções desordenadas.

Daí uma hora o personagem motivacional não aguenta, a maquiagem derrete, a mascara com um sorriso de plástico cai.… mas a cobrança continua e a solidão apenas aumenta. Mas ninguém quer estar ao lado de alguém que está em confusão emocional, por que é energia negativa, é exagero, "não é tudo isso não". Dizer que não está tudo bem é midiático e coisa de quem está querendo chamar atenção — eles dizem.

Ou talvez, seja isso mesmo, querer chamar atenção apenas para dizer: "oi, eu queria dizer que está difícil e eu gostaria de receber um abraço"

Atualmente minha cabeça é um lugar horrível para estar.

SAÚDE MENTAL:

"Ah, mas a vida é assim mesmo"
"Mas não fica assim não..."
"Você está exagerando, não é isso tudo não"
"A culpa é sua que se deixa levar por esses sentimentos"
"Relaxa! Um dia você vai rir de tudo isso"
"Não pense assim!!"
"Calma!"
"Pense em coisas positivas"
"Vamos focar nas coisas positivas!"
"Poxa..."
"Enfim, é complicado…"
"Vai passar"